quarta-feira, 30 de maio de 2007

A história das minhas histórias

E tudo foi por água abaixo. Anos de planejamento, investindo tempo e dinheiro para no final das contas acabar em nada. Se bem que, só de não ter ficado louco com o ocorrido já me considero no lucro. Cheguei a ficar paranóico com esse negócio de virar escritor.

Comprei livros e livros para aprender a escrever de maneira simples, direta, clara e ao mesmo tempo envolvente. Passei noites em claro escrevendo, a cabeça fervilhando de idéias, o teclado do computador já todo queimado com marcas de cigarros que eu esquecia acesos enquanto digitava, ou tomava uma dose de uísque vagabundo, ou ia ao banheiro vomitar, ou dormia bêbado em cima da mesa do computador.

No outro dia era sempre a mesma coisa. A mesma sensação de que não tinha sido o suficiente. Sem contar a sensação contraditória de que essa paranóia estava prejudicando o meu trabalho diurno, mas de que era um investimento. Investimento no sonho de me tornar célebre e formador de opinião. No mínimo um nome a ser lembrado pelas gerações futuras. E isso me enchia de forças para no dia seguinte praticar o mesmo ritual: escrever, fumar e beber até dormir sobre a mesa do computador. Mais marcas no teclado.

Por fim consegui terminar meu primeiro romance. Coisa grande de gente pequena. Um senhor romance que, sem diagramação, dava umas quatrocentas páginas. Em 5 anos de trabalho eu tinha quilos de contos e toneladas de poesias. Todos sobre os mais diversos temas. E agora tinha o meu primeiro romance.

Fiquei extremamente feliz ao comprar uma resma de papel para imprimir em casa mesmo e levar para algum amigo ler. Precisava de uma opinião. Imprimi tudo e deixei sobre a mesa. À noite eu levaria para um desses meus amigos metidos a sabichões e despeitados. Ele seria o primeiro a ler. Melhor ter uma crítica desse tipo de gente primeiro, assim nos preparamos para o pior. Dormi o sono dos justos e acabei não alcançando este objetivo.

No meio da manhã recebo um telefonema do síndico do prédio. Meu apartamento havia pegado fogo. Junto com ele queimaram-se os contos, as poesias e o maldito romance. Eu havia esquecido o ferro de passar ligado pela terceira vez. Só que dessa última vez eu havia passado roupa no meio da sala enquanto assistia o jornal da manhã. Queria ver as últimas notícias da cotação do dólar.

Ainda agora quando fecho os olhos imagino a cena: da tábua de passar para o tapete, do tapete para o sofá e para o carpete, do sofá para a cortina e do carpete para a casa toda. Que maravilha. Posso até ver o romance se queimando, e eu nem cheguei a dar um nome a ele coitado.

Como ele nem chegou a ser batizado posso até dizer que mais um pagão morreu queimado. Como bônus da minha tragédia tem ainda o fato de que eu não tinha nenhuma cópia de nada. Todo esse tempo e eu nunca mostrei nada a ninguém.

Agora estou aqui, escrevendo sobre a única história que me vêm a cabeça. A história das minhas histórias.

7 comentários:

Anônimo disse...

"Por Deus! Que desta vez eu consiga comentar com minhas proprias mãos!!!"

Arrggghhh, que dor no coração! Triste hisória, seria cômico se não fosse tão tragico...mas gostei do estilo de vida...computador, bebida, cigarro, madrugadas em claro e idéias rolando! Apesar de isso reduzir absurdamente a sua linha de vida onde daqui a alguns anos, você não terá um "M" em linhas na palma da mão, e sim um "N", eu tenho uma certa tendencia a gostar desse estilo de vida!

Vocês três são de mais!!!
Abraços!

Anônimo disse...

Cometário acima por: "Fernando Henrique"

Daniela Andrade disse...

"mais um pagão que morre queimado"

hahahahahahaha

pense da seguinte forma: pelo menos ele alcançou a purificação e hoje está salvo no paraíso dos livros e roteiros nunca dantes publicados!

=***

Unknown disse...

eu achei meio metafórico... não seria uma ótima leitura?? sério.... dá pra ensinar assim! hehehehehe

Anônimo disse...

Trágico! Trágico e trágico...
É só o que posso dizer...
Com medo disso, mando todos os dias meu livro para meu e-mail. Chega até a ser neurose.
Mas gostei do texto...
Abraços!

Daniela Andrade disse...

aliás, uns três textos meus bem velhinhos que eu adorava sobre todas as coisas se perderam em uma chuva que alagou meu apartamento...snif...

Unknown disse...

Nossa... essa é uma situação mais comum do que eu imaginava
rs