quarta-feira, 23 de abril de 2008

Timidez Subserviente

Era um rapaz bem apessoado, como diziam por aí antigamente. Dir-se-ia até mesmo bonito. Alto, porte atlético, dentes alvos e de um cuidado com a aparência beirando o exagero. Distinto, bem arrumado, inteligente, atlético; Fernandinho tinha apenas um problema: era extremamente tímido. Conquistava qualquer garota com um olhar ou um sorriso, mas bastava que uma pequena se aproximasse dele para que tudo ruísse.

Seu péssimo desempenho com as palavras quando enfrentando a situação do galanteio rendeu-lhe a fama de sangue de barata. Fernandinho engolia seco e nada dizia, porque no fundo sabia que merecia a indesejada alcunha. Incomodava-o o apelido quase tanto quanto o embaraço no trato com as mulheres.

Certo dia, em casa, resolveu tomar uma atitude e por-se a galantear todas que aparecessem em sua frente, até sentir que tinha naturalidade suficiente durante uma conversa banal sobre um assunto qualquer, tendo como meta a conquista. Treinava o cortejo, gestos e ensaiava diálogos dos mais desbaratados. Quando sentiu-se seguro seguiu para a rua e tentou colocar em prática o que havia treinado.

Desengonçado e acanhado, Fernandinho abordava as transeuntes. As faces ruborizadas ardiam num fogo de pudor e cautela inimagináveis em qualquer outra pessoa. Essa atitude defensiva e subserviente servia de pedestal para as mulheres que prontamente o ignoravam, isso quando não o destratavam. Essa onda avassaladora de negativas e humilhações fez com que no peito de Fernandinho crescesse uma revolta hedionda para com a vida.

Triste, ultrajado e macambúzio, Fernandinho retirou-se para a proteção de seu lar, sem imaginar que levaria consigo as ofensas recebidas na rua. Essas manifestações indignas do poder feminino ante um homem de atitude condescendente acumularam-se e cresceram a tal ponto que dominavam agora os pensamentos do pobre rapaz. Desesperado ante a rejeição geral e desejoso de um dia conseguir ter um relacionamento qualquer que fosse com uma garota, perdeu o controle de suas faculdades mentais e mergulhou em um estado de morbidez obtuso.

Passou horas largado sobre o sofá, olhando para um ponto fixo. Quase uma estátua. Subitamente num estalo recobrou a consciência, levantou-se afoitamente e dirigiu-se ao quarto. Lá dentro, abriu o criado-mudo de onde tirou o revólver. Encostou-o em sua fronte e puxou o gatilho.

Um disparo seco, seguido de um baque. A queda de um corpo inerte. Fernandinho, 21 anos, morrera virgem.

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