terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Psicanálise

__ Então...Sr. Miguel Leal, é isso?

__ Isso, doutor. Miguel Leal. Não precisa me chamar de senhor. Só Miguel. Só Leal. Miguelito, como diz o pessoal do bar. Enfim.

__ Bom...primeiro vamos definir o porquê da sua presença aqui. Recebi um relatório de uma moça da editora que diz...

__ Foi a Rosana, não foi? Pode dizer, doutor, eu sei que foi aquela vaca mal comida.

__ Perdão. Não vou estimular esse palavreado dentro do consultório.

__ Ah, então o senhor é outro desses psicanalistas de merda que nem deixam a gente dizer o que pensa? Deus, como eu odeio aquela editora.

__ Voltando ao que interessa...o senhor foi encaminhado até aqui por “bloqueio literário”. E pelo que me parece, andou publicando material ofensivo na internet.

__ Foi só um textinho no blog. Besteira, doutor, besteira. A editora quis me processar, a Rosana quis me processar, não falei nem fiz nada demais.

__ O senhor tem um contrato de dez publicações em cinco anos. Por que fez isso?

__ Porque eu sou louco! Que outra explicação há de haver? Quem escreve dois livros por ano? Só o Paulo Coelho, e eu duvido que seja ele que escreva de fato, agora que está até aparecendo em novela. Sei lá porque eu fiz isso. Doutor, eu amo escrever. Amo. Mais que tudo. Não, não mais que tudo. Amo minha mãe e minha namorada. Aliás, só consegui ser publicado depois que a Ana entrou na minha vida, ela é uma maravilha de pessoa, o senhor precisa ver, doutor. Então. Mas depois da Ana e da minha mãe, eu amo escrever. E eu nunca tinha publicado porra nenhuma na vida, nem carta em matéria de revista semanal, sempre fui frustrado, sempre. Sempre. Mas aí conheci a Ana e meu estômago se encheu de borboletas e eu comecei a escrever de um jeito que desse certo e essa editora gostou e me contratou, não por obra, mas por período, o que é bom, mas dois livros por ano? Só um louco assinaria embaixo, concorda? O problema é que não consigo mais escrever, porque só quero falar de amor, mas não sei falar de amor sem ser brega, porque as pessoas são ridículas quando amam, são bregas, eu acordo ouvindo Roberto Carlos! O senhor acredita nisso?

__ E por que não escrever sobre amor?

__ Porque a editora não quer! Porque a Rosana é uma mal amada que não quer que as pessoas sejam felizes com seus amores bem resolvidos. Eu tentei, doutor, eu juro que tentei. Mandei mais de cinco rascunhos por semana. Todos com o mesmo tema, é claro. O amor e a felicidade de amar e ser amado e como o dia é mais azul e feliz quando o amor dá certo. Mas eles não querem. Querem que eu fale sobre maldade e doenças radioativas e bombas de hidrogênio.

__ Miguel...o que foi que você escreveu no blog?

__ Só umas coisinhas, nada demais. Foi desabafo, doutor, desabafo, coisa de pseudo-intelectual desocupado. Tá, xinguei a Rosana uma ou duas vezes, falei que ia rescindir o contrato e fazer fogueira dele. Mas é besteira. Eles que levaram muito a sério. O blog teve muitas visitas, vê bem, todo mundo na editora se amarrou porque finalmente alguém estava desmascarando a Rosana.

__ Aqui diz que ela entrou de licença médica. Você não se sente responsável?

__ Eu não. Acho até que vou escrever algo sobre isso. Ela é uma neurastênica.

__ E sobre essa visita? Vai escrever algo no blog sobre essa sessão?

__ Claro! E qual é o pseudo-intelectual que não se amarra em análise?

Um comentário:

Anônimo disse...

"qual é o pseudo-intelectual que não se amarra em análise?"


hahahah po.... eu me enquadro nessa categoria =/